Passar para o conteúdo principal

Entrevista aos coordenadores dos GI RISKam, TERRITUR e ZEPHYRUS do CEG

Entrevista aos coordenadores dos GI RISKam, TERRITUR e ZEPHYRUS do CEG

Por ocasião dos 80 anos do CEG, entrevistamos os coordenadores dos seis grupos de investigação (GI) sobre os desafios e perspetivas futuras para cada núcleo. Na primeira parte desta entrevista, refletem sobre esta questão os investigadores Eusébio Reis, coordenador do RISKam – Avaliação e Gestão de Perigosidades e Risco Ambiental, Eduardo Brito-Henriques, coordenador do TERRITUR – Turismo, Património e Território, e Carla Mora, coordenadora do ZEPHYRUS – Alterações Climáticas e Sistemas Ambientais. 

P1. Refletindo sobre a investigação de maior relevância do GI que coordena e os novos desafios na investigação científica qual a visão para o futuro do RISKam?

Eusébio Reis: Criado em janeiro de 2009, como resultado de uma reestruturação interna do CEG, o grupo de investigação RISKam assumiu como linhas orientadoras a realização de estudos, teóricos e aplicados, de avaliação de suscetibilidade, perigosidade, vulnerabilidade, risco e perceção de riscos naturais, ambientais e tecnológicos, apoiados em técnicas de modelação espacial, com vista a dar respostas a problemas e desafios no âmbito do ordenamento e gestão do território e do planeamento de emergência. Inicialmente, o RISKam era formado por 17 elementos, oito dos quais doutorados, com formações e interesses diversos, para responder aos vários objetivos definidos pelo grupo de investigação. Todavia, os trabalhos desenvolvidos e a produção de resultados centravam-se essencialmente nos estudos de instabilidade de vertentes, temática que constitui, ainda hoje, a de maior projeção nacional e internacional no grupo.

Ao longo tempo, o RISKam cresceu de forma consistente, contando atualmente com cerca de 50 investigadores, entre os quais 23 doutorados, assim como 19 estudantes de doutoramento, e ainda vários bolseiros/estudantes de mestrado. Outras temáticas, antes inexistentes ou incipientes, ganharam dimensão, contribuindo para a diversidade dos assuntos e fenómenos abordados; destacam-se: dinâmica e inundações fluviais, mas também em contexto costeiro e estuarino, incêndios rurais/florestais, dinâmicas biogeográficas (essencialmente associadas a espécies invasoras), mas também risco potencial de arboviroses transmitidas por vetores, modelação de tsunami, perceção do risco e segurança ambiental, e dinâmicas de alteração de ocupação do solo.

Acompanhando essas tendências de crescimento e diversificação, há aspetos da evolução recente a realçar: para além da suscetibilidade e perigosidade, diversos estudos têm vindo a incorporar a avaliação de vulnerabilidade, quantificação de danos e análise de risco; acrescendo aos estudos de aplicação, ganham também relevância as abordagens mais conceptuais, associadas à perceção do perigo e ao desenvolvimento de metodologias para quantificação e gestão de risco; desenvolvimento dos estudos de multi-perigo, em particular em meio urbano, considerando a sua coincidência espacial, mas com tendência para a incorporação do efeito em cascata; a temática das alterações climáticas, cada vez mais presente, na análise de vários fenómenos perigosos.

Grande parte das metas encontra-se alicerçada, tal como na década e meia anterior, nos diversos projetos científicos nacionais e internacionais, nos quais assenta a maioria da produção do RISKam. É, no entanto, de realçar a importância da prestação de serviços à comunidade na atividade do grupo, com dezenas de consultadorias, na área do Ordenamento do Território, Reserva Ecológica Nacional e Riscos e Proteção Civil, em diferentes âmbitos geográficos, em que se destaca, mais recentemente, a partir de 2018, o foco na participação em projetos de alterações climáticas.

Futuramente, pretende-se a manutenção das temáticas mais tradicionais, a consolidação das mais recentes e o desenvolvimento de outras, menos presentes, mas fundamentais no contexto do território português. Assumem relevância particular, neste último caso, as questões relacionadas com a erosão do solo e a desertificação; a seca e os recursos hídricos continentais; o espaço marítimo e costeiro, em contexto de subida do nível médio das águas oceânicas. A adaptação às alterações climáticas é, certamente, um tema estratégico; em particular, é importante analisar e avaliar em que medida as alterações dos parâmetros do clima se repercutirão noutros fenómenos – instabilidade de vertentes, incêndios, inundações, particularmente as urbanas, disponibilidade de água, ondas de calor –, contribuindo, assim, para a gestão do risco, através do incremento da resiliência em relação aos desastres naturais e ambientais. 

P2. Refletindo sobre a investigação de maior relevância do GI que coordena e os novos desafios na investigação científica qual a visão para o futuro do TERRITUR?

Eduardo Brito-Henriques: Nos últimos anos houve três assuntos que mereceram especial atenção na investigação do TERRITUR: os impactes socioespaciais e conflitos gerados pelas mobilidades turísticas nas cidades, com destaque para as questões da turistificação e da gentrificação turística; as inovações no turismo, sobretudo ao nível do alojamento turístico e relacionadas com a digitalização; e, evidentemente, o impacte da COVID-19 no sistema turístico.

No futuro, creio que há razões para continuarmos a olhar para as interações entre a digitalização e o turismo com atenção, assim como para os impactes do turismo nos lugares de destino, nos seus ecossistemas, patrimónios, e comunidades locais. Considerando a rápida retoma que o turismo está a conhecer neste período pós-pandémico (em termos globais e particularmente em Portugal), acredito que analisar e debater os impactes socioambientais do turismo será crucial nos próximos anos. Isto significa em parte prosseguir a linha de investigação sobre a turistificação das cidades que temos estado a desenvolver no TERRITUR, mas significa também expandir e alargar essa análise a outras implicações territoriais e socioambientais do turismo. Neste contexto, devemos pensar, por exemplo, nas pressões da urbanização turística nas orlas costeiras, ou nas interações entre o turismo e o consumo de água, que é um tema de enorme sensibilidade e que justifica, entre outras perspetivas, um olhar a partir da lente da ecologia política.

Investigar e debater estas dimensões da conflitualidade socioambiental do turismo é fundamental para que se saiba corrigir o que há a corrigir no modelo de desenvolvimento do turismo e, ao mesmo tempo, para que possamos dar contributos positivos e válidos para a formação de políticas com vista a um futuro mais sustentável. A sustentabilidade do turismo é uma prioridade de investigação do nosso grupo que queremos tornar ainda mais central e aprofundar, com explorações em várias frentes: desde a análise dos processos de absorção de inovações «verdes» pelas empresas da cadeia de valor do turismo, à investigação de soluções para acelerar a descarbonização do setor, mas também explorando políticas e medidas para um embebimento mais harmonioso do turismo na vida dos lugares, nomeadamente através de novos modelos de governança e de participação das comunidades locais.

As interpenetrações de turismo e digitalização é, como disse, outro campo de investigação que nos interessa. Isto envolve desde explorar as possibilidade do big data nos estudos de procura, a examinar o papel das inovações tecnológicas no fornecimento de serviços de turismo (robótica, realidade virtual, etc.) e na criação de novos mercados e formas de mobilidade (nómadas digitais, por exemplo), a questões de cibersegurança, mas passa também por investigar, criticamente, o papel da mediação digital na interpretação e experiência de património e sítios, ou da inteligência artificial na comunicação em turismo e no branding de lugares. Alguns investigadores e investigadoras do TERRITUR estão muitos interessados em explorar estes assuntos e também em colocar isto em conversação com a Nova Bauhaus Europeia.

Finalmente, um tema absolutamente crítico e a que pretendemos dar relevância na investigação futura do TERRITUR é o binómio turismo-alterações climáticas. O desenvolvimento desta linha de investigação é, aliás, além do interesse intrínseco que a problemática possui e da sua importância societal, algo que me parece auspicioso para reforçar a coesão e a interdisciplinaridade da investigação do CEG, já que implicará fortalecer as parcerias com colegas de outros grupos de investigação, nomeadamente relacionados com o estudo das mudanças ambientais e dos riscos.

P3. Refletindo sobre a investigação de maior relevância do GI que coordena e os novos desafios na investigação científica qual a visão para o futuro do ZEPHYRUS?

Carla Mora: O ZEPHYRUS - Grupo de Investigação em Alterações Climáticas e Sistemas Ambientais é composto por 29 investigadores integrados, que incluem doutorados e um grupo muito dinâmico de estudantes de doutoramento e mestrado. A nossa história de investigação é rica e diversa, focando-se em vários temas associados às alterações climáticas, seus impactes no território e medidas de gestão, mitigação e adaptação a diversas escalas. Exemplos de sucesso são o nosso envolvimento em diversos planos municipais e intermunicipais de adaptação às alterações climáticas, na implementação e gestão do Estrela Geopark Mundial da UNESCO, na Rede Natura2000 e em iniciativas nacionais e europeias de coordenação das políticas para as ciências polares. 

As alterações climáticas, a perda de biodiversidade, o empobrecimento dos solos, bem como o uso insustentável dos recursos do planeta, são problemas prementes do presente. Sabemos também que muitos destes problemas estão bem diagnosticados e a necessitar de soluções urgentes.

O ZEPHYRUS encontra-se neste momento a preparar o seu plano estratégico para os próximos cinco anos, o qual se centrará no alinhamento das linhas de investigação que têm vindo a ser desenvolvidas, com novas prioridades focadas na construção e aplicação de soluções.

O cerne do trabalho do ZEPHYRUS desenvolver-se-á nas linhas de investigação seguintes:

  • Alterações climáticas, eventos extremos e seus impactes;
  • Alterações climáticas nas cidades e saúde humana;
  • Impactes das alterações climáticas nos ambientes polares;
  • Biogeografia numa Terra em mudança;
  • Alterações climáticas e gestão de ambientes de fronteira - as montanhas e os litorais.

A estratégia de investigação será alinhada com os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, em particular com o ODS 11 - Cidades e comunidades sustentáveis, ODS 13 - Ação climática, ODS 15 - Proteger a vida terrestre e ainda com o ODS 17 - Parcerias para a implementação dos objetivos.  

Os trabalhos realizar-se-ão através de projetos de investigação e redes nacionais e internacionais, com forte ligação aos stakeholders, e com iniciativas de ligação à sociedade, incluindo a educação e ciência-cidadã. A ligação com o Laboratório Associado TERRA será um vetor fundamental para contribuir para as políticas públicas.